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Contribuições à consulta pública para o aperfeiçoamento da governança da Internet no Brasil

  • Número: 113
  • Eixo: Outros temas ou considerações
  • Autoria: José Luiz Ribeiro Filho
  • Estado: Rio de Janeiro
  • Organização: Rede Nacional de Ensino e Pesquisa
  • Setor: Comunidade Científica e Tecnológica
  • Palavras Chaves: governança, competências, composição, pluralidade, transparência

Resumo

A Rede Nacional de Ensino e Pesquisa (RNP) teve papel histórico na introdução da Internet no Brasil tendo efetiva participação na criação do Comitê Gestor da Internet no Brasil em 1995. Desde então a RNP tem contribuído, direta e indiretamente, com a evolução da Internet no país, tanto nos seus aspectos tecnológicos quanto no processo de construção e amadurecimento do modelo multissetorial que governa a internet brasileira. Por isso, entendemos ser necessária a constante discussão e revisão desse modelo com o propósito de aperfeiçoá-lo e atualizá-lo, a fim de adequá-lo à dinâmica dos atores que conformam e representam os variados e legítimos interesses que movem a Internet, e aos anseios da sociedade por transparência e maior participação nos processos decisórios em todos os níveis e setores que, de alguma forma, interferem com a vida dos cidadãos.Apresentamos a seguir nossas contribuições e sugestões para o aperfeiçoamento do modelo de governança da Internet no Brasil.

Documento

Considerando a consulta pública aberta pelo Comitê Gestor da Internet (CGI) para receber propostas para revisão do atual modelo de governança da Internet no Brasil, a Rede Nacional de Ensino e Pesquisa apresenta abaixo a sua proposta para os 5 eixos da referida consulta. Em linhas gerais a RNP apoia a proposta apresentada pela ABRANET e outras entidades, endossada pela Sociedade Brasileira de Computação (SBC), que propõe um modelo aperfeiçoado com uma nova estrutura institucional para o CGI.br. A RNP concorda que a proposta da ABRANET  endereça e atende ao conjunto de princípios essenciais para a manutenção e aperfeiçoamento da atuação do CGI.br, consistente com o papel que lhe é reservado no arcabouço institucional da governança da Internet no Brasil. Destacamos e tecemos considerações adicionais, que apresentamos abaixo, a partir dos eixos da consulta pública:

- Competências do CGI

A autonomia do CGI.br precisa ser preservada para que possa cumprir com isenção o seu papel enquanto comitê multissetorial, representativo dos interesses e princípios da comunidade científica e tecnológica a respeito do desenvolvimento da internet; do terceiro setor, em favor dos cidadãos e práticas justas, transparentes e igualitárias na rede; do setor empresarial, agente de promoção da disseminação do uso da rede e desenvolvimento do mercado com base na livre iniciativa e competição salutar e, do Estado, responsável pela formulação de políticas públicas que visam o equilíbrio e a harmonização de todos os interesses e anseios desses e demais segmentos e dimensões de uma sociedade cada vez mais complexa. Além disso, o reconhecimento pelo Estado dessa autonomia por meio da regulamentação do modelo de governança brasileiro para a Interenet, resultado deste debate público, através de instrumento legal de mais alto nível como decreto ou lei ordinária, reveste-se de fundamental importância institucional para assegurar a legitimidade das resoluções e atos do CGI, incluindo a representação do Brasil em fóruns internacionais que discutem e regulam o funcionamento e uso da Internet.

A RNP entende que as atuais competências do CGI.br, conforme expressas pelo Decreto 4.829/2003, que dispõe sobre a “criação do Comitê Gestor da Internet no Brasil - CGI.br, o modelo de governança da Internet no Brasil, e dá outras providências” devem ser mantidas. Adicionando-se, ainda, as novas atribuições do CGI.br incorporadas pelo Decreto 8.771/2016, mais conhecido como o Marco Civil da Internet no Brasil, pelo qual a governança deve se dar por mecanismos multissetoriais e que o CGI.br deve participar da definição das diretrizes estratégicas para o desenvolvimento e uso da Internet no Brasil (art. 24 MCI), além das atribuições relativas a neutralidade da rede e padrões técnicos para a segurança da guarda e tratamento de dados pessoais.

Cabe reiterar ainda a necessidade de que sejam mantidas as disposições regulatórias em vigor que distinguem Internet de telecomunicações, conforme disposto pelos arts. 60 e 61 da Lei Geral das Telecomunicações 9.472/1998, bem como pela Norma 04/1995 dos Ministérios das Comunicações e Ciência, Tecnologia e Inovação. A RNP reconhece e destaca os benefícios que classificação da Internet no Brasil como serviço de valor adicionado trouxeram para o desenvolvimento e evolução da rede no Brasil em todas as suas dimensões. Por fim, entendemos que a administração do sistema de Registro de Nomes de Domínio .br deve ser mantida sob a responsabilidade do CGI.br, que desde a sua criação tem realizado trabalho exemplar, assegurando por meio de mecanismos técnicos, administrativos e até judiciais a preservação de direitos, isonomia de acesso ao serviço e promovido o crescimento do uso desse serviço na Internet do Brasil.

 

- Composição do CGI

A atual composição multissetorial do CGI deve ser mantida, com os mesmos setores e número de assentos no seu pleno. Entretanto, reiterando o nosso apoio ao modelo proposto pela ABRANET, a RNP defende a paridade na representação de todos os setores com o mesmo número de assentos e direito de voto para cada um no pleno, além de um assento para o diretor executivo do NIC.br, enquanto braço executivo/operacional do CGI. Além disso, concordamos com uma estrutura multicamadas que amplie a participação da diversidade de interesses em cada setor representado no pleno, permitindo e promovendo a ampliação dos canais de acesso ao CGI por meio de discussões e propostas realizadas nos conselhos das comunidades constituintes de cada setor.

Adicionalmente, defendemos a criação de mecanismos que introduzam e assegurem a pluralidade na representação nos assentos do pleno do CGI em cada um dos seus quatro setores. Tais mecanismos deverão evitar a captura de mais de um assento por grupos de interesse representativos de uma comunidade identificada nos conselhos setoriais. A definição da distribuição dos assentos dentre as referidas comunidades deverá ser objeto do processo eleitoral e ser orientada a partir de temas estratégicos identificados para cada ciclo/mandato do CGI.

 

- Eleição e mandato

As eleições dos conselheiros do pleno para os assentos dos representantes do setor científico e tecnológico, da sociedade civil/terceiro setor, e do setor empresarial deverão ser realizadas a cada três (03) anos, sendo os mesmos eleitos por seus respectivos setores para mandatos de três (03) anos, permitida uma única reeleição consecutiva. O novo modelo de governança deverá estabelecer os princípios fundamentais para o processo eleitoral, sendo que as normas específicas para cada processo serão estabelecidas por uma Comissão Eleitoral designada pelo CGI, que incluirá a participação de representantes dos conselhos setoriais (camada abaixo do pleno), respeitadas as características de cada segmento. Também deverão ser definidos os princípios e regras para credenciamento das comunidades que participarão dos conselhos setoriais e para a escolha de seus representantes.

 

- Transparência e outros temas e considerações

A busca incessante da sociedade por mecanismos, dentre os quais a Internet tem enorme valor, para promover a ampliação da participação direta dos cidadãos nas discussões e decisões sobre todo e qualquer tema que tenha impacto nas nossas vidas exige, entre outras coisas, o acesso cada vez maior às informações e, portanto, maior transparência. A transparência no acesso ao elemento essencial que é a informação original, preferencialmente sem nenhum tipo de tratamento ou intermediação, pode se dar por diversos mecanismos, incluindo tecnologias que permitam garantir a comprovação da sua origem, fidedignidade (p.ex. blockchain), autenticidade, localidade, sua identificação temporal, etc. Cabe ressaltar, entretanto, o cuidado com a preservação e proteção da dignidade humana, a privacidade assegurada por lei, o respeito aos direitos individuais e o sigilo quando necessário para, por exemplo, a instrução de processos criminais. Nesse sentido, defendemos e apoiamos todos os mecanismos que promovam a transparência sem, no entanto, criar constrangimento, inibição ou cerceamento da manifestação de qualquer tipo de opinião ou posicionamento dos indivíduos e, no caso específico, dos conselheiros do CGI.br. Entendemos ainda pertinente que seja incluído neste eixo a interpretação da transparência como elemento promotor de ações futuras, por meio de reflexões, discussões e planejamento estratégico das atividades do CGI para cada ciclo/mandato, com a definição de metas a serem atingidas e acompanhadas pela sociedade, que possam ser avaliadas e revistas anualmente.  Da mesma forma, propomos maior transparência e participação isonômica de temas de interesse de todos os setores na elaboração das pautas das reuniões do pleno do CGI.

 

Concluímos a nossa contribuição com considerações e sugestões neste eixo referentes ao relacionamento entre o CGI.br e o NIC.br. É pública e notória a excelência do NIC.br na execução das funções operacionais que suportam o funcionamento da Internet no Brasil, como a operação do Registro de Nomes de Dominio .br (e outros), do CERT.br, da secretaria executiva do CGI dentre outras. Entretanto, o crescimento da Internet, tanto em tamanho quanto na complexidade dos temas que se agregam ao uso e funcionamento da rede (não exclusivamente técnicos), representa um desafio para a capacidade de escala que uma única organização possa ter para responder adequadamente a tamanho desafio. Por este motivo, e com o olhar no futuro, entendemos que a verticalização de todas a funções de suporte da Internet do Brasil executadas por uma única instituição, como o NIC.br, deve ser repensada. Propomos a implantação gradual de um ecossistema de organizações de suporte operacional ao CGI.br, constituído a partir da identificação de temas e organizações com competências reconhecidas no país, que possam operar em parceria com CGI.br, reduzindo o risco de falha em uma ou mais funções por diferentes motivos e mitigando o impacto dessas falhas. Reiteramos, entretanto, a importância da manutenção da exclusividade da operação do serviço de nomes de domínio .br e da coordenação da distribuição de blocos IP e AS pelo NIC.br.